O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello considera negativa a aproximação do presidente da Corte, Dias Toffoli, com o presidente da República, Jair Bolsonaro, e critica o que vê como aumento da interferência política na definição da pauta de julgamentos da Corte.
“(O critério político) tem repercutido na definição da pauta, tem, nós não podemos negar. É a realidade”, afirmou em entrevista à BBC News Brasil. “Aí você se sujeita à confecção da pauta segundo a política governamental em curso?”, questionou.
Após encontros nas últimas semanas com Bolsonaro, os chefes do Legislativo Rodrigo Maia (presidente da Câmara) e David Alcolumbre (presidente do Senado), e também com parlamentares da bancada evangélica, Toffoli suspendeu julgamentos de temas delicados que já estavam marcados com meses de antecedência, como a ação que discute a descriminalização do porte de drogas para consumo próprio.
Outro caso retirado de pauta pouco antes do julgamento foi a ação que pede a legalização do aborto em casos da infecção da gestante pelo vírus da zika, agendada previamente para maio.
Marco Aurélio, relator da ação que levou à legalização da interrupção da gravidez de fetos anencéfalos em 2012, considera que a liberação irrestrita do aborto só cabe ao Congresso.
No entanto, ele defende que o STF autorize o procedimento em casos de zika durante a gestação, doença que provoca microcefalia do feto.
A ação, movida pelo PSOL em parceria com a organização Anis durante a epidemia de zika de 2015, argumenta que as mulheres não podem ser penalizadas pela falha do Estado em conter a doença. Já os opositores dizem que a legalização do aborto nesse caso seria eugenia.
“É um caso que realmente o Tribunal deve caminhar para admitir a interrupção”, defendeu o ministro.
O ministro, que deixará o STF obrigatoriamente em julho de 2021, ao completar 75 anos, criticou a provável indicação do ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, para a vaga de Celso de Mello, que se aposentará em novembro de 2020. Bolsonaro já disse estar comprometido a indicá-lo.
“Eu não compreendo como alguém que, depois de muitos anos atuando e com aplauso da sociedade em geral, vire as costas para a cadeira (de juiz). Não era vocacionado ao cargo”, afirma Marco Aurélio.
Repórter Ceará – BBC Brasil